Destinos no Chile: Da imaginação à realidade do Hotel Antumahal da família Pollak

Com gestão dividida entre a segunda e a terceira geração, hotel icônico em Pucón, no Chile, que chegou a hospedar Elizabeth II, é uma grande lição de empreendedorismo dos fundadores e respeito ao legado pelos herdeiros.
Pollak: Guillermo e Catalina, fundadores do Hotel Antumalal, se conheceram muito jovens. Eram aventureiros e gostavam de escalar montanhas nevadas. Final da década de 1930 na Tchecoslováquia, precisamente 1938. “Todos sabiam que a Segunda Guerra era iminente”, conta Rony. Nenhum dos dois queria encarar tudo aquilo. Eles decidiram casar-se e partir para América do Sul, porque uma prima já morava no Paraguai. Se casaram em Praga e tinham apenas 20 anos quando vieram. Antes de conhecer Catalina (a esposa), Guillermo Pollak dedicava-se ao serviço militar. As andanças pela Europa a trabalho lhe possibilitaram exercer um de seus hobbies, que era fotografar com sua câmera Laika. As fotos, preservadas pela herdeira até hoje, são verdadeiras obras de arte. Nessa rota da fotografia, apaixonou-se pela natureza e por sua mulher também.
O casal chegou a Buenos Aires e se deslocou para Assunção (Paraguai). Depois de um tempo, não adaptados ao país, voltaram para a capital argentina, onde tinham trabalho e outros parentes. Lá, descobriram que no Chile havia muitos lagos, outra paixão do casal. Chegaram a Portillo e, como amavam esqui, decidiram ficar por lá. Em Santiago, Guillermo soube das lindas paisagens do sul do país com muitos lagos e vulcões, e viu um anúncio da venda de uma propriedade em Pucón. Era no centro da cidade, a uma quadra da praia, e se chamava Hotel de la Playa.
“Quando eles chegaram ao local, minha mãe quase morreu diante da nova realidade. Ela era uma aristocrata em Praga. Eles chegaram ao lugar numa época de muita chuva, e tinha uma casa velha que estava caindo. Tempos depois, quando saiu o sol, eles arregaçaram as mangas e começaram a construir”, conta, emocionada, Rony.
Naquela época, existia na cidade o luxuoso Hotel de Pucón, para o qual vinham os funcionários das ferrovias. A cidade já era turística, mas apenas para famílias muito privilegiadas. Então, os Pollak começaram uma nova empreitada. Os pais de Catalina vieram em seguida para Pucón. “Depois disso, meu pai se tornou gerente de um centro de esqui na base do Vulcão Villarica”, conta Rony. E a cada inverno, levavam toda a mobília do Hotel de la Playa para a estação de esqui. “Tivemos uma infância de muito trabalho (ao lado de meus irmãos), mas muito feliz.”
Em 1948, uma grande erupção do vulcão destruiu o centro do esqui e matou três operários. Os Pollak ficaram só com o hotel e a cafeteria no centro de Pucón.
Antes da erupção, Guillermo havia comprado a propriedade onde está o Hotel Antumalal. Adquiriu uma gleba muito íngreme, de topografia muito difícil, à beira do Lago Villarica. As terras eram muito baratas, porque nelas não era possível criar animais nem extrair madeira. À época, Guillermo disse: “Aqui há um tesouro escondido”. Um dos proprietários dos lotes aumentou muito o preço, porque achou que o “tesouro escondido” era ouro. “Meus pais amavam o belo. Eles nunca iam imaginar, naquele momento, que o lugar se tornaria um hotel. O sonho deles era construir. Então, ergueram uma cafeteria.” O nome? A junção de duas palavras mapuches (população indígena local): antu+malal = sol + corral. “Significa ‘onde se deita o sol’”, conta Rony Pollak.
Três anos depois da erupção, o Hotel de la Playa pegou fogo e foi destruído. Então, Pollak construiu uma casa do lado do café. “Foi a primeira casa que tivemos, pois até então vivíamos no hotel, no centro da cidade. A cafeteria era um lugar lindo, mas precisávamos de outra fonte de dinheiro, porque não tínhamos mais a receita do inverno.” Guillermo resolveu então atrair para a cafeteria a elite que passava férias na cidade. Comprou uma lancha, atravessava o lago e vinha com os turistas para a propriedade. “Nessa época, meu pai já era dono do único posto de gasolina da cidade, chamado La Bomba”, conta.
A visão empresarial de Guillermo
Pollak soube que Gabriel Gonzales Videla, então presidente do Chile, viria à cidade e se hospedaria no Grande Hotel Pucón. “Meu pai, com sua diplomacia nata (pois não estudou nada), disse: quero que o presidente venha até a cafeteria”, conta Rony Pollak. Como conhecia o prefeito, conseguiu com ele que o presidente tomasse chá na cafeteria. Na ocasião, Guillermo falou ao estadista: “Senhor presidente, quero erguer um hotel que será o orgulho do Chile. Preciso de um empréstimo do Estado. Com o dinheiro vou construir um legado para o país”. Três milhões de pesos, pagos em oito anos, foram viabilizados como crédito pelo presidente.
A construção do hotel
Terreno íngreme, à beira do lago, com invernos rigorosos e pedras. Esses eram os ingredientes que Guillermo tinha para construir o hotel. O banco não conseguiu, naquele momento, viabilizar a liberação do crédito concedido pelo presidente. Isso porque em Pucón já existia um grande hotel. “Eles disseram que podiam liberar o recurso para a construção de um hotel em qualquer lugar, onde não houvesse um negócio desse tipo”, explica Rony. Com diplomacia, Guillermo convenceu que aquele era o lugar. Foi então que saíram para procurar um arquiteto.
A estrutura do Hotel Antumalal foi feita de concreto armado, por causa do medo do incêndio que aconteceu em Pucón (em 1947). O construtor era o próprio Guillermo. Ele trazia os operários, comprava os materiais. “Menos é mais” era o mantra. Uma mistura do minimalismo da escola Bauhaus e da inventividade de Frank Lloyd Wright no sul do Chile. Bauhaus pelos pilares, a ordem, a praticidade.
O legado e a terceira geração – Pollak
Quais os valores deixados pelos fundadores?
Rony Pollak: Trabalhadores, austeros. Nós nunca comprávamos roupas. Costurávamos a nossa roupa. O mesmo vale para a horta, e isso carrego comigo até hoje. Em Pucón, matavam um porco, faziam linguiças etc. Minha mãe aprendeu tudo isso aqui, e associou as culturas. Nós produzíamos a manteiga. Minha mãe estava à frente dos empregados, da cozinha e dos quartos. Meu pai era o recepcionista e o administrador. Ele à frente, ela nos bastidores. Eles aprenderam na raça. Liam muito. Pensavam em elegância e qualidade. Meu pai, embora fizesse o trabalho braçal, tinha obsessão pela cultura. Minha mãe tocava piano. No Chile, adotou o acordeão. Isso os diferenciava dos outros em Pucón.
Quais as lições que carrega consigo?
Pollak: Fazer bem feito. Nada pode ser medíocre ou quase lá. O referencial dos meus pais é muito alto. Meu pai deixou em testamento o hotel para mim, porque eu sinto o hotel. Não sou um gênio comercial, mas tenho a paixão. O resto vem. Quando meu pai morreu, eu já estava separada. Ele viu desde o início do meu casamento que eu precisaria voltar para o Chile. Meu pai queria que o hotel continuasse, independentemente das disputas entre irmãos. Eu tive que pagar muitas parcelas aos poucos para equalizar a herança deixada para os meus irmãos. Vamos seguir até onde podemos. Hoje divido a gestão com meu filho Andrew. Tenho a certeza de que consegui passar os nossos valores para os meus filhos. Eles não conviveram tanto com meus pais, mas carregam consigo o mesmo DNA.
Qual conselho daria a herdeiros de empresas familiares como você?
Pollak: Se há algo que tens paixão de fazer bem, nas palavras do meu pai, transfira transversalmente a toda a família. Hoje, adiciono a isso o amor. Na minha família, meus pais se preocupavam com o nosso futuro, mas tivemos poucos momentos de convivência depois de adultos. Não porque não nos amavam, mas porque trabalharam demais. Hoje o mundo nos exige muito. Então, não temos tempo de rir. Ria de si mesmo.
Fonte: Revista FBFE – Edição 02
Saiba Mais sobre o Hotel Antumahal: www.antumalal.com
Texto: Gustavo Curcio
Fotos: Gustavo Curcio
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