Cotas para mulheres no Conselho de Administração: os dois lados da moeda.
Olá,
No terceiro post sobre o Projeto de Lei que prevê cotas para mulheres no Conselho de Administração vamos debater quais são os objetivos, o que dizem os defensores e os opositores da iniciativa. No primeiro post “Cotas para mulheres no Conselho de Administração – Falácia ou Solução?” abordamos a realidade das mulheres em cargos executivos no Brasil; e no post da semana passada “Por que as mulheres são minoria em cargos executivos das organizações?” relatamos a questão da mulher e sua carga história, preconceito
Confira!
O Projeto de Lei PLS 112/2010
De autoria da Senadora Maria do Carmo do Nascimento Alves (DEM/SE), o projeto estabelece que os conselhos de administração das empresas públicas, sociedades de economia mista e demais empresas controladas pela União tenham percentual mínimo de 40% de mulheres em sua composição até 2024.
Para que este percentual seja atingido, são previstas metas progressivas para os períodos anteriores: 10% até 2018, 20% até 2020 e 30% até 2022 e 40% em 2024 (os prazos foram alterados pela terceira emenda, em função do decurso de prazo entre a apresentação do projeto e o trâmite que ainda deverá seguir até aprovação).
O projeto evoca os princípios da Dignidade e da igualdade amplamente reconhecidos pelos países democráticos e por organismos multilaterais como a ONU e OIT.
Ampara-se na justificativa da grande predominância de homens nos conselhos de administração como resultado da desigualdade de oportunidade entre os sexos, enfatizando que ocasiona uma restrição à colaboração efetiva das mulheres em decisões estratégicas sobre os rumos de recursos produzidos a partir dos esforços de toda a sociedade.
O PLS 112/2010 encontra-se na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, tem como relatora a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB) e não há expectativa de quando será encaminhado para promulgação.
Espera-se que as empresas a serem alcançadas por esse projeto de lei venham servir de modelo às administrações privadas. Há questões nesse projeto que são alvo de críticas, uma delas é que a cota se aplicaria apenas para cadeiras de titulares e não estipula penalidade para a empresa que não cumprir, podendo abrir caminho para transgressões.
Caso o projeto de lei seja aprovado, o Brasil será a primeira economia da América Latina a adotar um mandato legislativo para mulheres nos conselhos. Ele se juntará a outros 22 países com cotas para as mulheres, sejam por empresas estatais ou de capital aberto.
DEBATE SOBRE POLÍTICA DE COTAS
Lado A – O que dizem os defensores
A desigualdade de gênero nos conselhos corporativos de todo o mundo e a falta de diversidade entre os executivos seniores responsáveis pelas decisões está entrando mais na mira da opinião pública e dos acionistas. Se as empresas não estiverem preparadas para tomar medidas a fim de aprimorar essa combinação, é provável que outros assumam esse papel. A presença feminina nos conselhos é uma boa prática de governança, que diversifica as decisões e fortalece o grupo empresarial que adotá-la.
Para professores da Wharton University, grupos que incluem mulheres costumam ter maior inteligência coletiva, pois o relacionamento entre seus integrantes é mais educado e respeitoso. A diversidade em diferentes aspectos contribui para o desempenho dos grupos.
Para pesquisadores da University of Queensland in Austrália e da London School of Economics, mulheres levam mais a sério as tarefas de monitoramento do que os homens. Além disso, as conselheiras apresentam-se com maior frequência nas reuniões do que os conselheiros homens. A presença feminina nos conselhos ainda faz aumentar a frequência de seus pares do sexo masculino.
Resultados de estudos sugerem que, em média, os homens são mais propensos ao risco de que as mulheres que, em média, são mais cuidadosas e cautelosas para lidar com decisões monetárias ou financeiras.Outras características consideradas mais presentes entre as mulheres do que entre os homens são: empatia, habilidade para a comunicação, flexibilidade e propensão à busca pelo consenso para a tomada de decisões. Quanto aos estilos de liderança, as mulheres são mais comumente democráticas e dedicam maior atenção aos relacionamentos interpessoais, enquanto os homens são geralmente mais orientados pelo cumprimento das tarefas.
Para o grupo Mulheres do Brasil (MdB), liderado pela empresária Luiza Helena Trajano “Cotas são um mecanismo temporário para correção de distorções, que o mercado não consegue regular naturalmente”. No caso da participação de mulheres nos conselhos, a proposta do Mulheres do Brasil é de um processo compulsório, porém transitório, de modo que, após alcançado o patamar pretendido (propõe-se de 30%), permaneça por mais dez anos a fim de permitir a criação de um círculo virtuoso que se auto alimente.
Outra enérgica defensora das cotas é a gerente-geral do FMI, Christine Lagarde, que diz ter mudado de ideia sobre o tema porque os avanços nessa área, em sua opinião, estariam ocorrendo de forma muito lenta. “Eu sinceramente acredito que nunca deveria haver tanta testosterona em uma sala onde decisões importantes são tomadas”, afirmou, em uma entrevista ao Financial Times.
Segundo Turid Solvang, diretora do Instituto de Diretores da Noruega, que promove boas práticas de gestão corporativa, as cotas forçaram os diretores das empresas a olharem para outros lugares na hora de recrutar para os conselhos. “Houve uma profissionalização do recrutamento. As empresas tiveram de sair à caça de mulheres com qualificação e capacidade de liderança – e, ao fazerem isso, perceberam que, ao contrário das previsões iniciais, essas mulheres estavam lá”, diz Solvang, incluída no conselho de um banco após a adoção da medida.
Muitos dos que apoiam as cotas acreditam que a presença de mulheres no “topo” ajuda a quebrar estereótipos e convencer o resto da pirâmide corporativa de que profissionais do sexo feminino podem ser boas líderes.
Alguns estudos de psicologia mostram que os seres humanos procuram estar na companhia de semelhantes. Os conselheiros conhecem e indicam outros homens para novos cargos na empresa e não diversificam seu quadro com a presença de mulheres. Deste modo, não se permite que pessoas com olhar diferente cheguem ao campo de decisões e evita-se tal interação. Dessa forma, as empresas são mantidas homogêneas em questão de capacidade crítica.
E por que pensar que as melhores decisões para uma empresa seriam tomadas por um grupo de homens entre 50 e 60 anos que pensam iguais?
Lado B – O que dizem os opositores
Existe o risco das empresas nomearem mulheres para o conselho simplesmente para cumprir a legislação, ao invés de recrutarem a pessoa mais qualificada para o cargo. As empresas precisam de pessoas que as ajudem a trazer mais resultados, independente do gênero. Propor cotas é obrigar as empresas a contratarem pessoas somente para ocupar vagas.
Na Europa, alguns críticos enfatizam que as cotas obrigam as companhias a se livrarem de conselheiros competentes e experientes. Para cada mulher que entra em um conselho, como resultado da adoção do sistema, um executivo tem de ser dispensado.Há quem seja contra o sistema por considerá-lo uma interferência indevida do governo na liberdade das empresas decidirem por quem serão dirigidas.
“As cotas não são apenas desnecessárias, mas potencialmente perigosas e minam a igualdade que os grupos pró-cotas visam defender”, escreveu em um artigo a executiva britânica Helena Morrissey, mãe de nove filhos e criadora de uma organização que promove a inclusão de mulheres nos conselhos de empresas britânicas – sem imposições governamentais.
Sob o ponto de vista social, essas cotas não teriam significativo impacto sobre as situações de desigualdade de oportunidades que desfavorecem as mulheres em relação aos homens desde o início de suas carreiras profissionais, tanto quanto à remuneração como quanto às possibilidades de ascensão.
Além disso, como atualmente no Brasil há maior quantidade de homens que de mulheres entre os profissionais com experiências em outros conselhos de administração e/ou em cargos de executivo sênior, uma política de cotas poderia acarretar:
- Concentração excessiva das mesmas mulheres como conselheiras de várias empresas, sobrecarregando-as e comprometendo seu desempenho (na Noruega, essa concentração foi apelidada de “saias douradas”);
- Nomeação de profissionais sem as desejáveis experiências na alta administração ou na alta gestão.
Barreiras por todos os lados (entendendo o problema)
A limitada participação de mulheres em conselhos de administração nas empresas listadas no Brasil é apenas a ponta de um enorme iceberg, em relação à desigualdade de oportunidades econômicas que desfavorece as mulheres perante os homens.
Estudos diversos apontam que essa situação tem origens em complexas estruturas culturais e históricas. As dificuldades para ascensão são agravadas pela própria divisão social do trabalho que, no Brasil e em muitos outros países, delega para as mulheres quase todas as atividades para os cuidados da família.
No início de carreira, as mulheres têm suas competências reconhecidas, até mesmo porque muitas vezes entram no mercado de trabalho tecnicamente mais qualificadas. O impasse começa a surgir quando elas atingem a média gerência, fato que costuma coincidir com seu relógio biológico.
Em alguns casos, trata-se do momento de ascendência e elas precisam escolher entre a carreira e a maternidade, à medida que nem todas as empresas possuem flexibilidade para gestão das questões pessoais que surgem na vida da mulher neste período. Observa-se que, se um homem encerrar uma reunião antes do tempo previsto para levar o filho ao médico ou buscá-lo na escola, será elogiado e visto como dedicado, enquanto uma mulher na mesma situação normalmente é vista como alguém que não valoriza a carreira.
E você, o que pensa sobre o Projeto de Lei que prevê cotas para mulheres no Conselho de Administração das Empresas? Deixe aqui sua opinião!
Obrigada,
Dulce
Ótima colocação neste artigo sobre cotas para mulheres, muito enriquecedor e realista. Sem dúvidas a questão do patriarcado ainda rege o mundo dos negócios, e infelizmente, a mulher, para conseguir cargos de destaque tem que se dedicar muito mais do que o sexo oposto e ainda abrir mão de muitas coisas, inclusive a maternidade.